Nos anos 90, adultos e crianças cantavam freneticamente as músicas que eram lançadas pelo grupo musical Mamonas Assassinas. Mas será que prestavam atenção no que as letras diziam? 

Se distanciar do passado é uma forma de olhar para ele com mais atenção. E é por esse motivo que, ao ouvir o que os Mamonas Assassinas diziam, fica claro que letras das músicas, que eram performativas, escondiam com facilidade muitas críticas. 

Créditos: Kboing

Créditos: Kboing

#ParaTodosVerem – A imagem traz a capa de um dos álbuns do grupo musical Mamonas Assassinas. O fundo da fotografia é rosa e tem estampada a ilustração do busto de uma mulher nua com um colar prata com as letras M e A. No plano da frente estão os cinco integrantes da banda, alguns sérios e outros sorrindo. Na parte superior está escrito “Mamonas” em verde, e na parte inferior da capa do disco está escrito “Assassinas” em vermelho.

Abra sua mente, gay também é gente

Uma das músicas mais conhecidas do grupo musical e lançada em 1995 é “Robocop Gay”,  que carrega em sua letra uma crítica em relação ao que era considerado correto nos padrões heteronormativos.

A crítica era cantada de forma performativa e divertida, além de trazer consigo todos os integrantes do grupo vestidos como presidiários, mulheres e super-heróis nos shows que faziam. 

Mamonas show no Faustão

Créditos: iBahia.com

#ParaTodosVerem – A imagem é ambientada em um palco de programa de auditório. No plano da frente temos três integrantes da banda Mamonas Assassinas: dois deles estão com as roupas do He-Man, shorts e pantufas, eles tocam baixo e guitarra. O outro integrante, sendo ele o vocalista, está vestindo uma roupa do Batman, que acima dela há estampado um biquíni. No plano do fundo da fotografia, há diversas bailarinas com roupas verdes.

Robocop Gay

A letra da música Robocop Gay, quando escutada com atenção, pode ser dividida em três partes: as primeiras três estrofes referentes às características físicas e ao passado de um homem; as três estrofes seguintes fazem menção ao presente, ou seja, o que esse homem é de fato e por quem ele se apaixonou; no restante da canção temos esse mesmo homem desmistificando a homossexualidade em forma de conselho para quem ouve a música. 

Ouça a música aqui para continuar acompanhando o raciocínio do texto 

Homem com “M” maiúsculo 

Na primeira parte da música, é cantado o senso comum de um estereótipo de um homem com “M” maiúsculo. Nessa parte da letra, temos um homem que parece reproduzir um machão, mas que na verdade é gay. 

Ele exibe os seus músculos que “com tanto amor cultivei”, e no mesmo tom, é cantado que tem uma pistola de plástico, em formato cilíndrico. Essa menção, traz a dualidade do falo masculino, que na mesma medida em que representa poder e força, na música diz exatamente o contrário, pois é de plástico, tornando-o cínico aos olhos de quem o julga. 

Por fim, o tal assunto místico, que não pode ser tocado – como se fosse o mito do terceiro olho, é o bumbum desse homem. Por ser flácido e não corresponder com as expectativas (dele mesmo) e com o corpo que tem, faz uma cirurgia plástica, reafirmando o estereótipo do homem gay.

Ontem eu era católico, Ai, hoje sou um gay 

A segunda parte da música fala do momento pós cirurgia plástica que, ao acompanhar a letra da canção, os backing vocals dizem “silicone, yeah, yeah, yeah”. É nesse momento que deixando de lado os preceitos heteronormativos, como o de machão, que o vocalista canta com outras palavras (O meu andar é erótico / Com movimentos atômicos / Sou um amante robotico / Com direito a replay) o que socialmente é chamado de trejeitos.

Após o momento de realização do próprio corpo na forma física, o vocalista canta sobre um “ser humano fantástico / Com poderes atômicos”, que foi sua paixão. Assim, separa o passado e o presente quando diz que hoje está eufórico, e que “Ontem eu era católico / Ai, hoje eu sou um gay!”, como se para ser gay fosse necessária a desvinculação cristã, ou seja, questão que critica a fé da sexualidade homossexual. 

Tem gay que é Mohamed tentando camuflar 

Em forma de alerta, a última parte da música dos Mamonas Assassinas vem com a frase emblemática “Abra sua mente / Gay também é gente”, para falar que existem pessoas de todo tipo. Assim como “Baiano fala: Oxente / e come vatapá”, um homem pode ser gay e exercer sua sexualidade conforme desejar, pois isso é algo normal e intrínseco a ele, mesmo que fuja dos padrões pré estabelecidos, sendo um punk ou skinhead, por exemplo.

O trecho citado demonstra uma das intenções da música, que é fazer com que as pessoas que escutam entendam que não há problema em ser gay.  

Outro modo de olhar para a canção é pelo lado do conselho que o vocalista dá ao cantar “Faça bem a barba / Arranque seu bigode / Gaúcho também pode / Não tem que disfarçar”. Este conselho, assim como “Faça uma plástica / Ai, entre na ginástica”, é cantado como uma espécie de hino para dizer que, como gay também é gente, não há problemas em se mostrar, e que o que faz um homem que é machão ser visto como tal, pode ser deixado de lado para que a sua sexualidade real seja assumida também fisicamente.

Abra sua mente, gay também é gente 

Agora, ao abrir a mente (e os ouvidos) depois de ler sobre a canção Robocop Gay, fica claro que a letra era cantada para aproximar as pessoas de um universo que, mesmo sendo conhecido, era (e é até hoje) tratado com muito preconceito. Por esse motivo, o encaminhamento da letra da música, seguindo as três partes, além dos bordões, as performances e roupas que os integrantes da banda usavam, faziam com que as pessoas não prestassem atenção na mensagem que estava sendo passada.

A falta de atenção nas letras, principalmente em Robocop Gay, permitiu de certa forma que não houvesse censura musical, já que era tratada como “brincadeira”, e também permitiu a valorização e identificação, através da letra, de um grupo que era e ainda é marginalizado socialmente.

#ParaTodosVerem Imagem de capa – A fotografia tem estampados os cinco integrantes da banda Mamonas Assassinas. A imagem traz os homens posando apenas com o rosto colado uns aos outros. O visual deles foge do convencional, sendo que cada um deles têm uma característica: cabelo vermelho, óculos azul, boné para trás, chapéu colorido e óculos na testa. Nenhum deles olha diretamente para a câmera, todos estão olhando para lugares variados, sendo eles, esquerda, direita, acima e abaixo.

Referências

Letras

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