Existem vários tipos de realities shows, seja o mais conhecido no Brasil, o “BBB”, que reúne em uma casa diversas pessoas com personalidades diferentes, ou programas que envolvem competição ou relacionamentos amorosos. É claro, ninguém é obrigado a gostar de reality, mas concordamos que várias pessoas acompanham episódio por episódio.
No Comunica já abordamos o tema algumas vezes, apresentamos alguns, mostrando destaques e até críticas. Neste post faremos alguns comentários sobre eles de forma generalizada e depois abordaremos o “Casamento às Cegas” Brasil.
Realities Shows em geral
Uma análise que podemos fazer dos realities de forma geral tem como base o conceito de Indústria Cultural da Escola de Frankfurt, explicados na “Dialética do Iluminismo”, de 1944, de Adorno e Horkheimer. Para esses pensadores existe uma indústria cultural cujo objetivo é o lucro. Desse modo, se o lucro correr risco de acabar é uma ameaça¹.
A indústria cultural cria a necessidade de obtermos certos itens para nos satisfazer, nos sentirmos felizes momentaneamente e depois apresenta um novo produto para comprarmos de novo, criando ciclo. O lucro vem da criação de necessidades e outros fatores, como audiência e patrocinadores, no caso dos filmes, séries e realities.
Os artistas deixam de lado o seu individualismo, a criatividade, espontaneidade para a produção de algo que é mais dividido em compartimentos¹. Em um sistema capitalista, que é o nosso atualmente, a indústria cultural transforma a cultura em um produto a ser comercializado. Então músicas que fazem parte do local em que estamos podem virar um estilo de música com uma pequena letra e um ritmo chiclete, virando um produto cultural.
A indústria cultural é a indústria do entretenimento4. Em uma sociedade como a nossa, na qual os indivíduos trabalham 6 dias por semana por mais de oito horas, quando eles chegam em casa só querem se divertir seja mexendo em redes sociais ou vendo um filme, série, algo que não os faça pensar muito. Então, esses produtos acabam nos alienando para as questões importantes do nosso dia a dia, seja política e economia.
E a cada vez são lançados “novos” personagens e programas, para as pessoas não ficarem cansadas dos mesmos¹, ou seja, uma repetição. Podemos ver isso dentro de um audiovisual e na emissora. No primeiro: mesmo podendo ser um elenco novo a cada ano, o que você vê novamente não é algo inédito, é uma fórmula repetida. Além disso, nas emissoras quantos realities você assiste que possuem as mesmas características?! Um exemplo é dentro da própria Globo, o BBB e No Limite, várias pessoas reunidas que precisam passar pela convivência, provas de habilidades, eliminar participantes para no final o público decidir quem é o ganhador. Mesma fórmula, certo?!
E essa repetição leva a uma padronização do gosto dos consumidores³.Os meios ditam para o seu público o que de certa forma devemos gostar ou não. Você provavelmente não percebeu isso. Mas é assim, a crítica de uma geração da Escola de Frankfurt.
Casamento às Cegas Brasil
Em relação à teoria da indústria cultural, percebemos vários tópicos que se associam. O primeiro é o fato de que algo da nossa cultura acaba sendo comercializado em forma de programa. Como o amor, ou até mesmo o casamento, que antes mesmo desse reality já virou algo mais comercial, com filmes apresentando casamentos super chiques e caros. O encontro do seu par ideal, o parceire que você irá se casar, na nossa cultura é algo que a maioria das pessoas querem. O programa pega isso e transforma em um produto cultural que irá se espalhar através da internet.
O segundo, o lucro de Casamentos às Cegas Brasil vem para manter os usuários do streaming Netflix, além disso, para conseguir com que mais pessoas queiram assinar o serviço para acompanhar o reality. Então tem mais relação com a manutenção dos públicos da Netflix. O programa vai ganhar visibilidade, os seus vídeos no YouTube publicados pelo streaming podem ser monetizados, assim, ganham dinheiro com os teasers e com o “último episódio”.
Terceiro, esse programa é um forma de se entreter, vemos situações do nosso dia a dia em outras pessoas, como por exemplo, brigas entre casais, momentos afetivos, fofocas e o tão sonhado casamento. Nos divertimos através dos fatos que ocorrem com os participantes no programa, uma forma de alienação para o que está acontecendo ao nosso redor e até para questões mais profundas dos nossos relacionamentos que muitas vezes queremos esquecer.
A quarta, apesar de parecer algo inédito, já percebemos a fórmula parecida em outros programas. Como dentro do próprio streaming que faz diversos realities de relacionamentos, alguns podem ser às cegas, outros para criar um relacionamento com laços fortes. O canal de TV Lifetime, por exemplo, exibe um programa (2014 – 14 temporadas) em que especialistas utilizam um método científico para encontrar o parceiro para um participante, se casam e depois decidem se querem continuar casados². Parecido com Casamento às Cegas, certo? E associando a esse tópico ainda o audiovisual foi renovado, uma nova temporada para a geração de público e lucro.
Agora vamos para a parte mais social, sobre o tema do programa.
Então, outro tópico a ser analisado é a proposta do reality o “amor é cego”. Todos possuem o seu lado mais romântico e querem acreditar que é possível se apaixonar sem levar em conta a aparência das pessoas. O programa mostra um caminho que pode ser uma possibilidade, mas esquece de colocar a diversidade dos corpos.
As pessoas escolhidas para o experimento são o que atualmente chamamos de “padrões”. Geralmente homens altos, musculosos, sem deficiência, magro e héteros. E as mulheres, na sua maioria, magras, também sem deficiência, com um corpo que para mídia seria o ideal.
Se o “amor é cego”, por que não colocar pessoas LGBTQIA+, com alguma deficiência física, corpos diversificados5, muito magro (a), baixo (a), gordo (a) e até com condições econômicas diferentes?! Até no estilo podemos perceber que as pessoas são parecidas visualmente. Não percebemos ninguém com um estilo mais punk ou que gosta de usar algo mais largo, por exemplo.
Ao assistir com um grupo de pessoas, algumas delas comentaram: “do que adianta ser algo cego se todas as pessoas são bonitas?”
Ao pensarmos bem esse estilo de reality, dá uma segurança aos participantes que não vão encontrar parceiros com características que para a sociedade são consideradas diferentes. O programa tem indivíduos bonites. Seria visando o comercial? Pois tendo corpos diferentes do que a mídia apresenta e nos acostuma, se a produtora colocasse a diversidade menos pessoas assistiriam?! Ou ainda para eles seria constrangedor as pessoas não gostarem dos seus parceiros, comprovando assim, que o amor não é cego?!
O reality peca na falta de diversidade. Criando toda uma idealização de que as pessoas podem encontrar o seu parceiro se baseando na conversa, na essência. Mas vamos lembrar que muitas vezes a realidade machuca. Na sociedade em que vivemos a aparência e o seu corpo são levados em consideração. Então, pode ser que você já tenha levado em conta e escolhido alguém pelas características físicas do seu parceiro e vice e versa.
#ParaTodosVerem – Imagem da capa em horizontal formada por 4 fotos em preto e branco, a primeira várias notas de dólar, a de baixo uma cabeça de frente para uma TV, a 3° as cabines de Casamento às Cegas Brasil e a última três pessoas gordas que não podem ser identificadas.
Fontes:
¹ “Teoria da comunicação: ideias, conceitos e métodos” de Luiz Mauro Sá Martino
² TecMundo
4 “Dialética do Esclarecimento” de Adorno e Horkheimer
Indústria Cultural | Adorno e Horkheimer – Escola de Frankfurt – YouTube