Viajando um pouco pela história, durante os séculos XV e XVI, Portugal foi um dos maiores colonizadores e um dos países com mais conhecimentos náuticos, o que possibilitou que chegasse à América, à África e, assim, colonizassem alguns países desses continentes. 

Portugal nos deixou a língua, apesar dos povos nativos já terem a própria, mas será que nós, brasileiros, podemos provocar mudanças nessa mesma língua num processo reverso?  A resposta é sim, através de vários fenômenos midiáticos, os brasileiros conseguiram fazer com que a população lusitana usasse algumas expressões que utilizamos e até interferimos na construção sintática.

NOVELAS

Várias novelas da emissora Globo foram exportadas para Portugal nas décadas de 70 a 90, entre elas Roque Santeiro, Tieta e O Bem Amado. Segundo o jornal português Observador, algumas das novelas brasileiras transmitidas em Portugal geraram expressões que são lembradas até hoje por eles e por nós, é claro. Como “Nos trinques!” e “Eta lelê” de Tieta. Outras falas são lembradas pela revista Isto É, por causa da novela Gabriela, Cravo e Canela. Na época em que foi exibida era recorrente os portugueses usarem “moço bonito” ou “já lhe dei meu cartão?”. O jornal entrevistou um casal que relata ser comum a frase “eu te amo” ser usada por adultos por causa das novelas brasileiras. Para o país europeu o comum seria “Amo-te”. 

YOUTUBE

O mais recente evento que foi percebido pelos portugueses em relação a essa adoção de expressões brasileiras aconteceu com crianças por causa do YouTube. Por ficarem reclusos nas suas casas (COVID-19), assistiram por mais horas a youtubers do Brasil, como os irmãos Felipe e Luccas Neto. 

O último foi apontado pelo jornal DN de Portugal como um dos principais influenciadores desse fenômeno que vem ocorrendo com os menores. Segundo o DN as crianças “dizem grama em vez de relva, autocarro é ônibus, rebuçado é bala, riscas são listras e leite está na geladeira em vez de no frigorífico.”

Mas não foram só essas palavras que foram incorporadas no dia a dia das crianças. Usar “cara” nas frases, como “Tudo bem, cara?”, “ E aí, beleza?”¹. Ou pedir por um “picolé” no lugar de “gelado”, falar que vai ao “banheiro” no lugar de “casa de banho”, “cachoeira” e “dirigir” substituindo, respectivamente, “cascata” e “conduzir”². Além disso, algumas crianças mudam a construção das frases. Em Portugal é mais comum utilizar o verbo e depois o pronome, como “amo-te” ou “dá-me”. Segundo uma mãe, o filho usou “me dᔲ. 

Se observarmos bem as palavras usadas no país europeu não é do nosso dia a dia e nem possuímos o costume de usá-las, mas provavelmente utilizamos como sinônimos em escritos e frases. 

É interessante notar que as crianças podem “pegar” as nossas gírias, através de vídeos. Lembrando que estamos em outro continente e mesmo assim, a internet permite que populações de outros países conheçam as nossas expressões e até entendam o nosso sotaque.  

OPINIÕES

Esse fenômeno causou preocupações em Portugal. Várias mães ao perceberem que os seus filhos estão adotando até sotaques procuraram a ajuda de psicóloga¹ ou fonoaudióloga, para auxiliar a mudança de dicção². A preocupação se deve também por causa do vício em consumir vídeos e depois que isso acontece, pode ficar complicado, diferente dos jovens que seria uma fase, segundo a entrevistada Catarina Menezes para o jornal DN de Portugal. 

Um grande problema surge na educação de Portugal quando se fala em um português “brasileiro”. Muitos consideram que o jeito que falamos é errado e até já houve relatos de estudantes recebendo notas menores por escrever abrasileirado, que alguns lusitanos consideram inapropriado³. 

Outros consideram essa apropriação das crianças por expressões de outro país momentânea como foi na época das novelas4,5. Entretanto, é claro que há aqueles que aceitam e não se preocupam. Como mostra o jornal O Globo, entrevistou um professor para quem  essas expressões mostram a diversidade da língua portuguesa. 

De acordo com a reportagem do site Exame, alguns brasileiros ao saberem dessa situação viram como “colonialismo reverso”. Afinal os portugueses desde 1500 quando vieram ao Brasil, colonizaram o nosso território. Então, quando eles começam a usar palavras do nosso vocabulário, na qual foi mostrado por brasileiros, seria o algo “reverso”. Como não poderíamos pensar desse jeito?!

Outro fato que chamou atenção das pessoas, tanto brasileiras quanto portuguesas, foi o tom da matéria do Jornal DN, tendo um possível preconceito5. A controvérsia começa com o título, que pode gerar debates: “Há crianças portuguesas que só falam ‘brasileiro’ “, dá a ideia de idiomas diferentes. Além disso, acabam inferiorizando o português brasileiro em relação ao de Portugal. Mas, as duas nações falam a mesma língua com algumas diferenças. 

Entendemos agora como os brasileiros podem impactar um estilo de vida, que palavras e construções de frases tão normais para a gente podem causar discussões e preocupações. Estamos tão acostumados com a adoção de vocábulos internacionais que não percebemos como pode ocorrer o contrário também. 

#ParaTodosVerem – Imagem de capa em horizontal de cinco crianças de costas com cabelos pretos e todos com os braços erguidos, no fundo tem árvores. Na imagem tem um “filtro”, opacidade menor da metade da bandeira brasileira do lado esquerdo e do lado direito a bandeira de Portugal.

Fontes: 

¹ Isto É 

² O Globo 

³ Mega Curioso 

DN

Exame