Racismo, desigualdade e injustiça. Pessoas, essas três palavras estão associadas a muitas coisas no cenário atual, e sei que todes aqui têm a exata noção do que significam. Mas elas estão associadas ao vocabulário ambiental também. Certamente quem lê esta coluna sabe de suas responsabilidade e culpas ambientais. Desde o uso que fazem dos automóveis, daquele lixinho que jogam “sem querer, querendo” no meio da rua, de um dia ou outro que não fazem a separação da reciclagem, o consumo de tal marca de refrigerante que sabem que consome milhões de litros de água etc. Pequenas infrações do cotidiano que colocam uma pulguinha de culpa em nós e nos fazem pensar que somos diretamente responsáveis pela situação de crise ambiental do planeta. Sim, estaríamos todes na listinha de poluidores, em que figuram grandes empresas, os bilionários e seus foguetes e muitos governos nacionais. E, é nessa sensação de culpa individualizada que mora o perigo e surgem os desvios de atenção aos problemas sociais e políticos que a crise ambiental ajuda a gerar.

Vejam só, algumas décadas atrás, nos EUA, surgiu um movimento de combate ao racismo e as injustiças ambientais. Um grupo de intelectuais, alguns proeminentes membros da igreja protestante e outros, realizaram estudos que indicavam que grande parte dos locais de maior perigo ambiental (como por exemplo, a existência de lixões, depósitos de produtos tóxicos, industrias poluentes, rios contaminados etc.) estavam em áreas que eram habitadas por populações pobres e invariavelmente negras dos EUA. Isso facilmente pode ser levado a dimensões maiores, tal como o mundo todo. Se pensarmos no âmbito da divisão entre Hemisfério Norte e o Sul, temos aí outras formas de consideração desse situação de desequilíbrio entre áreas “mais ou menos” melhor protegidas dos focos de poluição e outras completamente tomadas por essa poluição, que em sua maioria estão abaixo da linha do equador.

Tal concentração de focos de poluição em países, cidades, bairros e afins, particularmente próximos ou até mesmo juntos com certas populações tem se configurado como uma forma de racismo, ambiental. Ou seja, quando a escolha por áreas de acumulo de material poluente é feita a partir da visibilidade política e social, ou melhor, nas áreas pobres e de característica negra.

O racismo ambiental leva também a marca da desigualdade e da injustiça. Quando somos culpabilizados individualmente pela poluição, acabamos sendo levados a pensar que os problemas ambientais e a solução são democráticas. Democracia no sentido que todos podemos e teríamos condições de agir sobre o problema, além do fato, também, de que seriamos atingidos pela poluição de igual forma. Mas se a concentração da poluição gerada é das grandes indústrias (aqui incluso o agronegócio) e o local de despejo desses poluentes tem predileções de classe social e raça, então onde fica a democracia das questões ambientais? Não existe, ao contrário, qualquer socialização da culpa e das consequências é uma forma de esconder as desigualdades, as injustiças e, evidentemente, o racismo. Isso não significa que as nossas ações individuais não devem ser feitas, ao contrário, apenas que a luta ambiental deve ter como foco o sistema produtivo e de consumo, os desequilíbrios provocados por isso e tem em mente que as consequências serão sofridas, inicialmente, pelos mais vulneráveis econômica e socialmente.