Vocês sabiam que dia 7 de abril foi Dia do Jornalista? Data que nos relembra o quão essencial esse profissional é na comunidade, ainda mais em dias como hoje. Vivemos um turbilhão de informações, principalmente na internet, que chegam até nós, muitas vezes sem nenhuma comprovação de veracidade. Pensando nisso, convidamos a jornalista Dra. Tatiana Maria Silva Galvão Dourado para uma conversa sobre jornalismo, Fake News e pandemia.
Comunica: As Fake News sempre estiveram presentes na comunicação? Quando começaram a ganhar força?
Tatiana: Sim, a invenção de fatos e o uso estratégico de notícias fabricadas, ou de notícias fraudulentas, são táticas de manipulação informativa empregadas em conformidade com tecnologias, mídias e conhecimento disponíveis em diferentes momentos históricos. Junto a isso, podemos pensar que processos de equívocos generalizados, que são formados acerca de temas, eventos, questões públicas, atores políticos e etc., podem resultar também de processos comunicativos bastantes informais, que se apoiam na circulação de informações ambíguas e incertas (como é típico de rotinas de rumores) entre indivíduos. Como terceiro elemento, mensagens que exploram estereótipos e que reforçam identidades sociais (enquanto silenciam grupos vulneráveis, por exemplo) são propagadas pelos media e por líderes de opinião há muito tempo, contribuindo para polarização política, social e afetiva. Fake news, enquanto notícias fabricadas distribuídas digitalmente, começam a chamar atenção do mundo após 2016, porque, junto com a vitória eleitoral de Donald Trump e com a decisão da saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit), percebeu-se que as trocas informativas, a conversação política e a discussão pública estavam ali se dando em torno de fontes suspeitas e de informações falsas (fake news). Para piorar, começou a chamar atenção a quantidade incontável de mensagens baseadas em distorções, negacionismo, conspiração e ideias extremistas com alto engajamento digital, principalmente em plataformas de mídias sociais como Facebook e Twitter (no Brasil, o WhatsApp também é um lugar cativo na paisagem desinformativa, como vocês sabem). O fenômeno das fake news e a desordem informativa online, como lidamos hoje, têm acompanhado a ascensão de pautas, movimentos e lideranças conservadoras e de extrema-direita que usam fortemente a internet, em especial, fóruns online, aplicativos de mensagens privadas e mídias sociais. É um retrato da atualidade, o que não significa que notícias fabricadas não sejam usadas para fortalecimento de vínculos partidários e em campanhas negativas também por parte da esquerda.
Comunica: Como as fakes news atrapalham o trabalho dos jornalistas?
Tatiana: Na carona de iniciativas independentes de fact-checking, veículos de comunicação tradicionais têm implementado editorias próprias dedicadas à verificação de fatos, o que demanda investimento, recursos humanos e tempo. A capacidade de viralização das fake news, assim sendo, tem demandado novas habilidades, oportunidades e mais trabalho no campo do jornalismo. Jornalistas hoje, portanto, precisam também reportar as falsidades que circulam online e explicar à audiência, com transparência, o porquê aquilo é falso. Isso precisa ser feito em nível local, regional, nacional, de modo a se tornar conhecido ao grande público. Ao mesmo tempo, peças de fake news e outros conteúdos enganosos são parte hoje de uma crise epistêmica acentuada, o que significa que parte do público que consome notícia fabricada, negacionismo e distorções em série são resistentes a correções (como checagem de fato) e são críticos contumazes da imprensa.
Comunica: Podemos dizer que o trabalho dos jornalistas está sendo cada vez mais afetado pelas fake news?
Tatiana: Sim, é um problema que exige ainda mais cuidado, visto que qualquer deslize (como barrigadas) e qualquer notícia entendida como uma crítica por certos grupos são rebatidas com “fake news” e “desinformação”, em natural politização e disputa dos termos. Além disso, cada vez mais há repórteres sendo atacados e ameaçados (especialmente profissionais mulheres) por um público raivoso e de postura antidemocrática, inclusive líderes políticos. Por outro lado, é também uma nova fase para reinventar o jornalismo, para complementar a atividade para além das fronteiras das grandes redações, para apoiar iniciativas dedicadas a reportagens investigativas e ao jornalismo de dados, contribuindo para alavancar o empreendedorismo e a independência do campo.
Comunica: Qual o impacto das fake news na pandemia?
Tatiana: Muito ruim. Peças de fake news (aqui, como notícia fabricada/fraudulenta) são impulsionadas por indivíduos envolvidos previamente com uma série de ideias propagadas por teorias da conspiração, teses negacionistas e percepções equivocadas de mundo. Essas pessoas estão hoje conectadas, produzem conteúdo, trocam informações, influenciam uns aos outros e têm alta capacidade de engajamento em torno de crenças enraizadas longitudinalmente. Quando peças de fake news são difundidas, por exemplo, com apelo anti-vacina, anti-5G (radiação), anti-China, anti-esquerda, anti-fulano e daí em diante são rapidamente espalhadas no âmbito dessas redes coesas e fragmentadas, com ampla capacidade de viralização. O efeito disso não poderia ser mais nocivo. Esse clima de opinião gera uma pressão enorme sobre governos que atrapalha a produção, implementação e eficácia de políticas públicas (isolamento social e a vacinação em massa são exemplos), gera um caos no sistema de saúde pública, confusão na definição de prioridades e as milhares de mortes que temos vivido no Brasil.
Infelizmente, os impactos das fakes news, em um momento tão crítico, principalmente aqui no nosso país, traz danos ainda mais intensos, colocando em risco a vida de milhões de pessoas. Chequem sempre a veracidade da notícia antes de compartilhar, valorizem os jornalistas!