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Aos 3 anos, Karin participou de sua primeira apresentação em um palco. Curitibana de nascença e amante das artes, sempre teve o sonho de fazer parte da companhia Balé Teatro Guaíra. Aos 8 anos começou a escola de dança do Teatro Guaíra para dar início à sua jornada em busca de sua aspiração. Desde então, segue com a companhia fazendo parte de seu elenco de bailarinos há mais de 9 anos.
Ela, como muitas crianças do Paraná, cresceram com a presença do Teatro Guaíra e de seu balé sendo parte importante da cultura do estado. A companhia, que completa 51 anos este mês, foi criada 1965 e é a terceira companhia pública mais antiga do país. Já conta com mais de 150 coreografias apresentadas por todo o Brasil, além da passagem de grandes nomes da dança nacional, como Ana Botafogo, que estreou como solista no Guairão, e o coreógrafo de O Grande Circo Místico, Carlos Trincheira.

Escola de Dança Teatro Guaíra se apresenta no Guairão.
Com a pandemia de Covid-19 e a necessidade do isolamento social, este será o primeiro aniversário que a companhia passará longe dos palcos, mas como o show deve sempre continuar, os bailarinos seguem trabalhando para levar cultura, agora de forma online, para todos os paranaenses. O projeto em específico para a comemoração dos 51 anos do Balé Teatro Guaíra foi postado dia 12 de abril, no perfil do Instagram do teatro. Um vídeo de 2 minutos, composto de outros vídeos gravados pelas bailarinas, cada uma em sua casa, remonta a apresentação da coreografia do Balé Carmen de uma forma diferente e inusitada. Clique aqui para conferir.
O Balé Teatro Guaíra é um patrimônio cultural e artístico do nosso estado, e está revertendo este momento atípico em compartilhamento da arte e da dança com o máximo de pessoas possível por meio da internet. Por isso, o Comunica conversou com dois participantes da companhia, o Pedro Pires, atual diretor, e Karin Chaves, bailarina. Para conhecer suas histórias, a história do Balé Carmen, e quais são os planos da companhia durante a quarentena.
“Então você poder comemorar 51 anos de uma companhia de balé num país como o Brasil, é o máximo!” – Pedro Pires
Comunica: Vocês podem contar para nós como começaram suas histórias com o Balé Teatro Guaíra?
Karin: Minha história com a companhia começou desde quando eu comecei a dançar, porque eu sou natural de Curitiba e minha referência de dança sempre foi o Balé Teatro Guaíra, um ícone de referência, de qualidade e de onde eu gostaria de estar. Pra mim já era planejado estar lá. Eu fiz a escola de dança do teatro, pela escola eu tinha 8 anos, mas a primeira vez que eu dancei eu tinha 3 anos, desde bem novinha eu tenho uma relação com o Balé Guaíra, pra mim é um sonho concretizado estar lá hoje.
Pedro: Minha história com o Balé Guaíra é bem mais antiga do que vocês, né (risos). Eu entrei no Balé Guaíra com 19 anos, sou gaúcho, fiz escola de dança no Rio Grande do Sul e fiz audição para Balé Guaíra quando tinha 18 anos. Passei na audição e me mudei para Curitiba para começar minha carreira aqui e desenvolvi toda a primeira parte dela na cidade. Através da direção do Balé Guaíra eu tive bolsa de estudo em Paris e em Lisboa, eu aprendi muito. Na primeira vez eu fiquei na companhia durante 10 anos aí eu fui para o balé da cidade de São Paulo, fundei a minha própria companhia em Curitiba, viajei o mundo inteiro, e agora, depois de muitos anos, cai de paraquedas na direção do Balé Teatro Guaíra, o que é uma honra pra mim por ter sido minha primeira casa profissional, e foi a casa que me formou como um bom profissional que eu acho que eu sou.
Comunica: O que esses 51 anos do Balé Teatro Guaíra representam para vocês e para a nossa comunidade?
Karin: Bom, pra mim esse aniversário de 51 anos significa renovação, uma maneira que a gente precisa encontrar de continuar com as coisas que a gente tem feito na companhia, continuar difundindo arte e cultura pelo estado… Também representa muito a contemplação do passado, a gente tem contemplado muito o passado e valorizado muito nossa história.
Pedro: Eu acho que é muito importante se comemorar, sabe? Porque nós vivemos em um país sem uma grande tradição cultural, e nesse momento, além da pandemia, nós estamos passando por muitas transformações políticas, e estamos em um momento muito delicado principalmente na área da cultura e artes em geral. Então você poder comemorar 51 anos de uma companhia de balé num país como o Brasil, é o máximo! É uma coisa incrível, a companhia, apesar de todos os problemas, ter conseguido chegar até aqui com 51 anos de idade e com uma linda história, se fortalecendo cada vez mais, se tornando sempre cada vez mais uma pedra bem estruturada da cultura paranaense principalmente.

Karin Chaves apresentando Carmen.
O Balé Carmen, escolhido para o vídeo de homenagem, transforma em coreografia uma ópera criada no século XIX, em 1864, que conta a história de “amor” entre a cigana Carmen e Don José. Ele ao final da peça mata sua amada por se recusar a aceitar o fim da relação dos dois: “Dizem que é uma história de amor. O estranho de se pensar é que quando a gente procura pela história, ninguém cita que ele matou ela e esse fato parece não ter muita importância. Mas hoje em dia a gente sabe que essa história se trata de um feminicídio, ele mata ela, diz que é por amor, mas a gente sabe que isso não existe.” Comenta Karin ao ser questionada sobre a história da peça.
A possibilidade que o Balé Carmen dava aos bailarinos de realizar a coreografia em casa foi o principal motivador da escolha da peça para o vídeo. “Nós pensamos coreograficamente, do repertório da companhia, o que daria para fazer em casa? É muito difícil né, cada um na sua casa, não tem como fazer um conjunto, você precisaria ter um mesmo tempo musical para todo mundo, é muito complicado. Só que Carmen dá essa possibilidade para gente porque tem essa parte da coreografia, que as meninas fazem (o banco), que permite” nos conta Pedro.
Nós da comunicação sabemos como é trabalhoso produzir audiovisual e todas suas etapas, eles como bailarinos estão descobrindo o processo agora, por isso o Comunica perguntou a eles como está sendo projeto audiovisual, com a gravação e a edição.
Karin: A produção no começo foi difícil né, porque você ter que fazer em casa uma cena que você faz no palco, com plateia, com história, com figurino, data marcada, é uma vivência totalmente diferente… Eu coloquei meu celular em um lugar específico e filmei várias vezes, de mais perto, de mais longe, até que eu mandei para o editor que também é bailarino, ele se prontificou a fazer a edição deste vídeo. É um vídeo demorado porque somos 11 mulheres, então ele teve que lidar com 11 vídeos das meninas e colocar isso num mosaico, fez uma criação super bacana para entregar o produto final aí, e deu super certo né?
Ao encaminharmos o assunto para saber como andam a rotina dos bailarinos sem os ensaios presenciais e as apresentações, descobrimos que o Balé Teatro Guaíra está trabalhando como nunca! A companhia está com a programação de aulas semanais (online) para seu elenco, com dois ensaios por semana e a partir de semana que vem três aulas, de balé clássico e de condicionamento físico. “Falando em preparação, eu fiz uma barra para treinar em casa, eu e meu marido somos bailarinos e moramos em um apartamento pequeno e tem que ter um lugar para fazer aula em casa, então um faz aula no balcão, outro na barra..” nos conta Karin.
Pedro: Ao pensar que nós somos uma companhia pública, temos que descobrir novas formas de trabalhar para atender a demanda do próprio Teatro Guaíra e da própria Secretaria de Cultura do Estado. Temos duas frentes de trabalho: uma diretamente com os bailarinos, sobre aulas, discussões dos projetos que estamos criando, quase todos os produtos que estamos criando partiram deles, o que é incrível. E o outro lado é estar fazendo essa ligação da companhia com o estado e a instituição Teatro Guaíra, descobrir esses produtos que possam suprir essa demanda, não só artisticamente como politicamente, porque a gente não pode ficar parado. A gente produz coisas que vão para o teatro e o teatro distribui isso para as redes, agora como fazer isso?

Pedro Pires, atual diretor da companhia Balé Teatro Guaíra.
“Já digo de antemão, não só o que vocês viram que já foi para web, mas muita coisa está vindo por aí para vocês!” – Pedro Pires.
O Balé Teatro Guaíra já vem disponibilizando semanalmente, pela plataforma YouTube, vídeos completo das obras do repertório da companhia. Já foram lançados Carmen, Romeu e Julieta, Segundo Sopro, e outros ainda entrarão. Vídeos de 10 segundos performados e coreografados pelos próprios bailarinos foram a primeira experiência da equipe para transportar o balé dos palcos às telas pelo audiovisual, que também já estão no ar. Como bons curiosos, nós pedimos alguns spoilers do que está para vir. Pedro e Karin falaram com gosto dos vários projetos planejados, mas infelizmente este post já está chegando ao fim com um gostinho de quero mais.
Como a conversa com os dois integrantes rendeu bastante, resolvemos dividi-la em duas partes, nos próximos dias vamos lançar a continuação da reportagem contando em detalhes o que a companhia planeja para os próximos meses, como está sendo o feedback do público, e um recadinho especial para todos os amantes da dança. Aguardem!
Atualização em 29 de junho de 2020 – a Parte B dessa reportagem pode ser acessada aqui:
Balé Teatro Guaíra comemora 51 anos e oferece cursos de dança online – Parte B