O NUMAPE – Núcleo Maria da Penha é um projeto de extensão que promove atendimento gratuito, seja jurídico ou psicossocial, às mulheres em situação de violência doméstica, familiar e de gênero. Além disso, desenvolve trabalhos e ações de conscientização e esclarecimentos às mulheres e à comunidade dos tipos de violência existentes, seja física, verbal, psicológica, moral ou patrimonial. O Núcleo, na UEM, foi criado em 2016 e até hoje tem seus serviços prestados por suas profissionais e estagiárias dos campos de Direito, Psicologia e Serviço Social, possuindo um subsídio da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Estado do Paraná – SETI/PR.

Equipe do NUMAPE (Foto via Facebook NUMAPE UEM)
Esse ano, o Núcleo promoveu ações nos “16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres”, para se aproximar de órgãos que atendam mulheres em situação de vulnerabilidade extrema, como mulheres negras, com deficiência, bem como transexuais e travestis. No dia 25/11, ocorreu o “Diálogos sobre violência contra a mulher”, organizado pela ONG Marias da Internet, já no segundo dia, 26/11, houve a “Campanha de enfrentamento à violência contra a mulher”, organizada pela Prefeitura de Paiçandu. No dia 30/11, o Núcleo participou do “UEM na Praça” e, no final de semana seguinte, 03/12, voltou novamente às praças com o “Plantão NUMAPE na praça”, contando com o apoio do Ministério Público do Paraná. O último dia da ação, 12/12, será marcado por uma mesa redonda, “Violência contra as mulheres: epistemologias e intersecções, e ocorrerá às 19h, no bloco C34 da UEM, com entrada gratuita, mas é necessário se inscrever para o evento.
A mesa terá mediação da Dra. Gláucia Valéria Pinheiro de Brida (NUMAPE/UEM) e o seu início com a Dra. Crishna Mirella de Andrade Correa (NUMAPE/UEM), com a fala “Subjetividades e interseccionalidades em contextos de violência doméstica”, além de contar com a participação da Dra. Maria de Fátima Lima Santos (UFRJ), que abordará “Raça, gênero e sexualidades: corpos, subjetividades e resistências em contextos bio-necropolíticos” e com a Dra. Anahi Guedes de Mello (UFSC), que discutirá acerca de “Gênero, violência e deficiência”.

Foto via Facebook Numape UEM
Sendo assim, o Comunica entrou em contato com a Dra. Crishna Mirella de Andrade Correa, Coordenadora do NUMAPE, para conhecer um pouco mais do Núcleo, de seu funcionamento e diferenciais, destacando tanto sua relevância social como acadêmica.
COMUNICA: Na cidade de Maringá há alguns locais que prestam serviços semelhantes aos do NUMAPE. Como este núcleo se diferencia dos demais estabelecimentos? Estar dentro de uma universidade traz algum benefício direto?
Crishna Correa: O NUMAPE é o único lugar que possui núcleo jurídico que presta assistência especializada em violência doméstica e familiar dentro da rede de enfrentamento da comarca de Maringá. O órgão que mais se aproxima do trabalho do NUMAPE é o CRAMM (Centro de Referência e Atendimento à Mulher Maria Mariá) , mas é um lugar que consegue atuar somente no atendimento psicossocial e informações gerais sobre denúncia, porque não tem advogadas (não pode atuar em processos judiciais). O diferencial do atendimento desse Núcleo é a qualificação especializada das profissionais. Nós fazemos incursões dentro das teorias de gênero em geral, e nas teorias especializadas em violência doméstica. Além disso analisamos dados e contextos locais, nacionais e internacionais sobre o tema, para que seja possível fazer uma escuta mais qualificada das mulheres que atendemos. Como estamos dentro da Universidade o NUMAPE tem também um projeto pedagógico, que tem como focos principais: reforçar os estudos interdisciplinares entre as áreas envolvidas (no sentido de mostrar como as realidades sociais sempre requerem produções de metodologias conjuntas de análise e atuação); aprofundar estudos interseccionais para proporcionar às participantes (universitárias) do projeto uma clareza sobre os marcadores que atravessam as violências (como raça, identidades de gênero, classe, deficiência); tornar visível para a população de fora da universidade e outros órgãos da rede a importância dos estudos de gênero como ferramenta de trabalho e análise dentro dessa área e a importância dos movimentos feministas na conquista de direitos das mulheres.
COMUNICA: Quando se analisam os serviços prestados pelo NUMAPE, percebe-se um atendimento muito voltado a comunidade externa da universidade. Como você acredita que o Núcleo colabora para a comunidade interna, os acadêmicos, servidores?
Crishna Correa: O NUMAPE existe a partir de um edital do Universidade Sem Fronteiras (USF) situado dentro da estrutura da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado do Paraná. Esse edital é específico para formação e ampliação de núcleos que atendam à violência doméstica e familiar (objeto da Lei Maria da Penha). Além disso, o edital delimita o público que pode ser assistido no âmbito jurídico: somente mulheres em situação de violência doméstica ou familiar, que possuem até 3 salários mínimos de renda e cerca de até 180.000,00 de bens imóveis (excluindo a renda do autor da violência). Então, a partir desse edital, o Núcleo funciona assim: a equipe psicossocial atende qualquer mulher que esteja sofrendo ou sofreu violência e precisa de escuta e acolhimento. Esse acolhimento pode durar por várias sessões ou até meses, até que a mulher decida o que pretende fazer em relação à situação de violência. Caso seja identificada pela equipe uma situação de violência doméstica e familiar e a mulher passar pela nossa triagem de renda (descrita acima) nós encaminhamos para a equipe jurídica dar andamento a processos judiciais que decorrem da situação que esta mulher está passando e que ela escolhe requerer (geralmente são pedidos de divórcio, guarda dos filhos/as, pensão alimentícia…). No âmbito criminal, prestamos as orientações que as mulheres precisam caso queiram fazer denúncia da violência e solicitamos medidas protetivas se for necessário durante o curso de qualquer desses processos. Para entender atuação do NUMAPE e o público mais frequente que nos procura é preciso entender a diferença técnica (jurídica) entre as violências, já que o edital restringe a participação da nossa equipe jurídica à violência doméstica e familiar sofrida por mulheres de baixa renda.
Violência doméstica e familiar: é toda violência sofrida no âmbito doméstico e familiar. Então, o autor(as) da violência pode ser um cônjuge, companheiro(a), ex-companheiro(a), ex namorado(a), pai, mãe, irmão, tio, primo(a), avô/avó, um(a) amigo(a) frequente, ou seja, alguém que faz parte do âmbito de relações familiares daquela mulher, entendendo a categoria “familiar” para além da família nuclear. A equipe psicossocial e jurídicas do NUMAPE podem atuar nesses casos.
Assédio sexual: tecnicamente, para o direito, assédio sexual é um crime de “constranger alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função”. Somente a equipe psicossocial do NUMAPE pode atender esses casos, prestando acolhimento e indicando serviços e locais de denúncia para que essas violências sejam processadas. Pelo edital que nos constitui, a equipe jurídica não pode se habilitar nesses processos. Portanto, quando ocorrem casos de assédio sexual na universidade, nós podemos fazer somente o acolhimento e encaminhar para quem pode processar. É o que já fizemos no passado e continuamos fazendo nessas situações.
Estupro: se for no âmbito da violência doméstica e familiar, toda a equipe atende, senão, somente a equipe psicossocial atende.
Então, voltando à pergunta: sim, o nosso público é formado em maior parte por mulheres de fora da Universidade (aliás,é para isso que a Extensão está voltada dentro do tripé pesquisa, ensino e extensão que sustenta a universidade). Também fazem parte do nosso público servidoras e empregadas terceirizadas da UEM, assim como muitas acadêmicas. Algumas professoras são atendidas pela equipe psicossocial do NUMAPE, mas a maioria não chega a acessar a equipe jurídica por causa do critério de renda. Esse critério é muito importante para nós porque: 1) trabalhamos com a ideia de possibilitar que mulheres de baixa renda possam acessar seus direitos; 2) temos apenas duas advogadas e 2 estagiárias de Direito para dar conta de cerca de 100 processos judiciais por ano (sendo que cada um desses processos tem diversas ações: guarda, alimentos, divórcio, denúncias e medidas protetivas). Além disso, essas advogadas precisam participar das reuniões interdisciplinares e do grupo de estudo do núcleo (reuniões quinzenais). Logo, o tempo é curto e a escolha do edital da SETI é destiná-lo à mulheres de baixa renda, especificamente em situação de violência doméstica e familiar, sejam mulheres de dentro da UEM ou da comunidade externa.
COMUNICA: Infelizmente, vemos diariamente notícias que envolvem violências contra mulheres e, felizmente, também houve um aumento nas denúncias. Você acredita que instituições, núcleos, etc como o NUMAPE colaboram para essa nova perspectiva? O que mais falta na legislação para uma proteção plena das mulheres, para que talvez haja uma diminuição nos casos de violência?
Crishna Correa: É evidente que núcleos como o NUMAPE fazem diferença no campo da formação de acadêmicas(os) envolvidas(os) no projeto e na possibilidade das mulheres acessarem seus direitos, inclusive o direito à denúncia. Mas me parece que o protagonismo exagerado na área do Direito (no que se refere ao orçamento destinado à políticas públicas na área) não é a melhor opção de investimento se pensarmos na diminuição da violência. Digo isso porque sabemos que a área que pode de fato atuar melhor na prevenção é a educação. Precisamos discutir o machismo no âmbito da educação para compreender porque as mulheres sofrem tantas violências e porque o processo de saída da violência é tão demorado. Da mesma forma, no âmbito dos(as) autores(as) de violência, é importante a compreensão de como o machismo é formado em alguém. A partir de quais frustrações, a partir de quais modelos de homem e mulher, companheiro ou companheira engendrados na cultura social se aprende a querer possuir o corpo, a vida e a alma de alguém. Portanto, parece-me que a instância judicial é mais útil nas medidas protetivas (que de fato são de urgência) e nas soluções no âmbito do Direito de Família, que resolvem juridicamente questões importantes, mas a violência doméstica como um fenômeno social deve ser resolvido através do eixo preventivo e esse eixo da Lei Maria da Penha é o que recebe menos investimento.
COMUNICA: O núcleo é composto pelas áreas do Direito, Serviço Social e Psicologia. Como a junção dessas três vertentes em um mesmo ambiente potencializam e corroboram para os serviços prestados?
Crishna Correa: A compreensão da violência doméstica necessariamente passa pela compreensão de todos os fatores envolvidos no cotidiano das mulheres. Esses fatores são a dependência financeira e afetiva, as violências psicológicas, os esquemas de relações abusivas e possessivas, a pobreza, a raça, as limitações físicas. Portanto, o trabalho da Psicologia e do Serviço Social é fundamental para realizarmos uma escuta que seja capaz de perceber esses elementos e entender o nível de compreensão que a mulher assistida têm dessas violências. A interação com a área do Direito garante que a equipe jurídica tenha uma compreensão mais abrangente das violências (e não só meramente técnica), assim como permite uma ampliação de conhecimento sobre os serviços da Psicologia e do Serviço Social disponíveis na rede. Faltam ainda no NUMAPE as áreas da Pedagogia (que poderia potencializar o trabalho com as escolas) e a Comunicação (que poderia auxiliar na compreensão das questões de representação, dos modos de comunicar/dialogar, da importância da comunicação para a acessibilidade, entre outras coisas), que são áreas também normalmente consideradas estratégicas no enfrentamento à violência. Para a entrada dessas áreas, estamos esperando bolsas.
COMUNICA: De que forma ocorre o atendimento realizado pelo NUMAPE?
Crishna Correa: Primeiro atendimento/acolhimento psicossocial, depois atendimento jurídico (mas geralmente alguém do psicossocial está junto no atendimento jurídico). A mulher não repete a história duas vezes. A equipe jurídica já vai para a reunião sabendo do caso e propondo estratégias de ação. A equipe é formada por:
2 advogadas
2 estagiárias do Direito
1 psicóloga
1 estagiária da Psicologia
1 assistente social
2 professoras supervisoras da Psicologia
2 professoras supervisoras do Direito
1 supervisora do Serviço Social
1 coordenadora (pode ser de qualquer uma das três áreas, mas é interessante que possua alguma experiência ou estudos em metodologias interdisciplinares).
Além dos atendimentos, as equipes fazem reuniões semanais dentro das áreas com as supervisoras e reuniões quinzenais de equipe para falar da complexidade dos casos com toda a equipe reunida. Além disso, temos grupo de estudo quinzenal. A equipe psicossocial faz também visitas institucionais para se aproximar de públicos específicos (ex: na ASUMAR para compreender melhor a realidade das mulheres surdas; na Associação de imigrantes, na APAE e etc). Temos também “cadeira” no Conselho da Comunidade-cárcere e participamos das reuniões de rede fora da UEM (geralmente divididas em zona norte e sul da cidade, abrangendo órgãos do serviço social, da saúde, da educação e da psicologia (raramente do Direito, infelizmente). Também chamamos reuniões de rede para dentro do NUMAPE para discutir com a rede casos específicos, se for necessário.

Espaço do NUMAPE na UEM (Foto: Mariana Manieri Pires Cardoso)
O NUMAPE está localizado no bloco A-01, na Universidade Estadual de Maringá. Para mais informações é possível ir até a sede, que funciona de segunda à sexta-feira, das 13h30 às 17h30, bem como contatar pelo telefone (44) 3011-5477 ou pelo e-mail numap.uem@gmail.com, além do Facebook e do Site do núcleo. Há, ainda, diversos Núcleos Maria da Penha no estado do Paraná, uma vez que é um “projeto que propicia uma nova perspectiva de vida às mulheres vítimas de violência doméstica, devolvendo-lhes o controle sobre a situação e sobre a sua integridade física e psicológica, resgatando a dignidade que lhes é inerente e que, por um lapso temporal, foi-lhes tomada, e que, no entanto, após reempossada sua autonomia, não mais lhe será tirada”, sendo de fundamental importância a sua existência em diversas cidades. O NUMAPE também pode ser encontrado nas seguintes localidades do Paraná:
Universidade Estadual de Londrina (UEL)
Endereço: Rua Brasil, 742 – Centro, Londrina/PR
Telefone: (43) 3344-0929
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 8h30 às 17h00
Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)
Endereço: Av. Maria Perpétua da Cruz, s/n Ponta Grossa
Telefone: (42) 2102-8614/ 2102-8615/ 3220-3475
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 8h às 17h
Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste)
Endereço: Rua Pernambuco, 1777, Marechal Cândido Rondon
Telefone: (45) 3284-7938
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 9h30 às 11h30 e das 13h às 17h
Francisco Beltrão
Endereço: Rua Maringá, 1200, Centro de Pesquisa, bloco 1, sala 4
Telefone: (46) 3520-4861
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 08:00 às 12:00, 13:30 às 17:30
Toledo
Endereço: Rua da Faculdade, 645
Telefone: (45) 3379-4099
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 8h às 12h e das 13h às 18h
Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro)
Endereço: PR 153, km 7, Riozinho, Bloco principal sala 103
Telefone: (42) 3421-3086 / (42) 99904-1423
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 8h às 12h e das 13h às 18h
Guarapuava
Endereço: Alameda Élio Antonio Dallavecchia, 838, Vila Carli
Telefone: (42) 3629-8158 / 8399
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 12h às 18h
Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP)
Endereço: Avenida Manoel Ribas 711, Centro, Jacarezinho
Telefone: (43) 3525-0862
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 8h às 12h e das 13h às 17h
Universidade Estadual do Paraná (Unespar)
Endereço: Av. Gabriel Esperidião, s/no, sala 17, Paranavaí
Telefone: (44) 3424-0100
Horário de atendimento: segunda à sexta, das 9:00 às 17:00 horas