Lançado em 2018, o livro “Cotas raciais e o discurso da mídia: Um Estudo sobre a Construção do Dissenso”, da Doutora e Mestre em Comunicação e Cultura pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) faz um resgate histórico sobre a construção do discurso midiático em torno das políticas de cotas raciais implantadas em algumas universidades e instituições públicas e debatidas nas últimas décadas. Martins, com a orientação de Muniz Sodré, buscou uma explicação na história dos conteúdos midiáticos para o modo como é representada a população negra no Brasil, a comunicóloga afirma que antes das ações afirmativas havia uma ausência de representação negra na TV brasileira e que agora, há uma grande diferença de tratamento quando o assunto é, por exemplo, cotas raciais e notícias de violência e estereotipadas.

“Antes do advento das ações afirmativas, a população negra pouco aparecia na mídia, salvo em determinadas circunstâncias, como futebol, carnaval, matérias de crime ou, ainda, em situações exóticas, em que o corpo da mulher negra era valorizado”

Martins percebe em seus estudos que há uma “incoerência” no discurso midiático, que nas últimas décadas passa a reconhecer o fato histórico da escravidão e das consequências e resquícios desse período de 400 anos nas relações sociais atuais, entretanto, não reconhece as cotas raciais como um dispositivo de reparação efetivo e chega a “vender” um discurso de que as cotas deveriam ser sociais, para que não haja uma “divisão no país”. Segundo a análise da Doutora, isso se deve também ao fato de uma elite que não deseja conviver com a igualdade social e com as pessoas negras e pobres ocupando seus espaços historicamente garantidos.

Foram analisados os cadernos de opinião dos jornais O Globo,  O Dia e  Folha de S. Paulo, durante 12 meses no ano de 2008, um ano que a pesquisadora considerava propício para a discussão do tema, devido principalmente a eleição de Barack Obama nos Estados Unidos e ao fato da política de cotas raciais da UERJ estar fazendo 5 anos nesta data. Entretanto, o que a pesquisadora descobriu foi o que ela chama de “comunicação simbólica do silêncio”, pois a pesquisa mostrou que nos doze meses analisados, o tema das cotas raciais e ações afirmativas apareceu em apenas 2,2% dos editoriais destes jornais, que ainda trataram o assunto com superficialidade e brevidade.

“O estudo evidencia a prática do silêncio pela mídia ao revelar a escassez de publicações; apresenta um discurso midiático que oscila entre espaços vazios e a retórica do dissenso. Mostra ainda a construção simbólica de um “desejo de verdade” e uma narrativa que mais confunde do que esclarece, deixando os próprios atores sociais envolvidos confusos entre o sim e o não.”

Martins reafirma a necessidade de um discurso responsável e consistente, em formatos investigativos que mostrassem os bons resultados que a política de cotas tem no Brasil, mostrando também a responsabilidade do Estado nessa discussão e fazendo matérias historicamente contextualizadas com a realidade sócio histórica e econômica da população negra e assim ajudando no combate ao racismo.

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Capa do livro de Zilda Martins Barbosa

Atualmente, universidades como UEL, UESC, UENP, UFPR, USP, UNICAMP, UERJ, UnB e todas as universidades públicas do Paraná, já adotam um sistema de cotas raciais em seus vestibulares. Dentro da Universidade Estadual de Maringá (UEM), já se discute a implantação de cotas raciais no processo avaliativo há mais de 10 anos, sendo em 2009 implantadas as cotas sociais, estas não facilitaram efetivamente o acesso da população negra. O coletivo negro Yalodê-Badá e o NEIAB fizeram em 2018 uma petição online pelas cotas, que contou com milhares de assinaturas e foi entregue ao reitor da universidade. A Profa. Dra. Marivânia Conceição Araújo afirmou em entrevista à UEM TV (confira a seguir):

“As cotas raciais são NECESSÁRIAS, pois vivemos num país racista, onde as desigualdades raciais não diminuirão sem ações afirmativas voltadas para beneficiar negras e negros, elas propiciarão que eles também se tornem profissionais em todas as áreas do conhecimento e não apenas nos postos com menores salários. Com as cotas raciais a UEM será pluriracial, diversa e inclusiva, uma universidade em que todos estarão representados, convivendo e aprendendo com aqueles que se convencionou chamar de ‘diferentes'”


Fontes:

Correio Nagô

UEM TV

NEIAB

Yalodê-Badá

Editora Appris