Entrevista com professoras surdas da ANPACIN.
Ser mulher é um enorme desafio, o silenciamento social e as dificuldades do dia a dia fazem com que o gênero feminino atravesse obstáculos constantemente.
Ser mulher e ser surda são sinônimos de coragem para enfrentar as barreiras de preconceitos sociais. Pensando nisso, o Comunica decidiu conversar com mulheres que vivem nessa realidade.
Em entrevista com as professoras surdas da ANPACIN, sendo elas: Valeria Cristina Camparoto de Souza; Rosineide Aparecida Moreira de Souza; Viviane Romero Girotto; Kenia Jessica Yamanaka Gongora. A escola é especializada em alfabetizar crianças surdas e localizada dentro da UEM. Em contato com essas mulheres percebemos o quão ampla é a comunicação, e que ela não depende apenas da escuta e da fala, muito pelo contrário, é através das Libras (segundo idioma oficial do Brasil) que boa parte da população feminina e surda se comunica no nosso país. Para a conversa contamos com a ajuda e tradução da pedagoga Déborah.
A língua de sinais nem sempre foi aceita mundialmente. Em 1880 aconteceu o Congresso sobre surdez em Milão, e nele essa língua foi proibida, pois acreditava-se que a leitura labial era a melhor forma de comunicação para os surdos. No Brasil, foi somente em 1993 que a batalha recomeçou para uma regulamentação da linguagem de sinais, mas foi somente em 2002 que a lei foi finalmente aprovada.
“ LEI Nº 10.436, DE 24 DE ABRIL DE 2002.
Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e dá outras providências. |
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais – Libras e outros recursos de expressão.”
Tal decreto de lei possibilitou maior abrangência no conhecimento dessa língua, por isso torna-se sempre importante o tipo de ensino que é feito pelas professoras entrevistadas na ANPACIN.
Rosineide, professora da ANPACIN
Perguntamos a elas, qual seria a forma que elas potencializam as expressões para se comunicar:
“Como eu não tenho oralidade, foi por meio da língua de sinais que eu comecei a perceber o quanto eu estava sendo compreendida. A língua de sinais me possibilita uma comunicação fluente” declarou Valéria Camparoto.
“As LIBRAS são meios visuais, então eu me identifico com essa minha língua materna para me expressar” declara Rosineide Moreira, que é casada com um homem também deficiente auditivo, fazendo com que em sua casa a comunicação seja predominantemente em Libras.
Viviane diz que no primeiro contato com a língua, se emocionou:
“Passei 17 anos da minha vida sem Libras, devido a proibição, no dia que eu vi a língua de sinais, até chorei, fiquei muito emocionada, a partir daí comecei a ter mais contato com pessoas que também eram surdas”
Viviane, professora da ANPACIN
Viviane conta que estudou em uma escola de inclusão, não exclusiva de surdos, por isso, sofreu muito preconceito dos colegas, por ser surda.
Dentre as dificuldades e desafios enfrentados historicamente pelas mulheres, infelizmente o machismo e o abuso são os mais recorrentes. As mulheres surdas não podem reagir pela oralidade, sendo assim, perguntamos a elas como enfrentaram alguma situação de repressão masculina.
Quando questionadas sobre algum possível tipo de abuso ou machismo que elas já tenham sofrido, Kenia conta:
“Já sofri um relacionamento abusivo quando era jovem, namorava um rapaz ouvinte que era muito violento e se aproveitava de mim. Minha sorte foi que minha mãe me ajudou e me levou a delegacia da mulher”.
Rosineide diz:
“Quando percebo uma abordagem estranha de um homem, já tento escapar.”
Elas declaram que o machismo e os enfrentamento de situações delicadas como essa também são assuntos das conversas entre amigas, sendo elas surdas ou ouvintes, e que a convivência e compartilhamento de ideias entre mulheres surdas faz-se amplamente compreensível por meio das LIBRAS.
Kenia, professora da ANPACIN
Grandes autores da comunicação falam sobre a necessidade intrínseca do ser humano de se comunicar. Nós do Comunica reconhecemos e sentimos na pele todos os dias, as dificuldades enfrentadas por sermos mulheres, principalmente para se comunicar. Em ambientes de trabalho, estudo, família, amigos, ou seja, em todos os lugares precisamos intensificar nossa comunicação para termos o mínimo: reconhecimento. No caso das mulheres surdas, as dificuldades diárias são ainda maiores, aprendendo Libras contribuímos com inclusão de tais e também adquirimos um grande conhecimento, afinal, como já dito, ela é a segunda língua oficial do Brasil.
Caso se interesse, a ANPACIN possui aula de libras para ouvintes com duração de dois meses. Para mais informações, ligue: 44 3224-7545.