Pantera Negra foi um dos assuntos mais comentados do ano, e se tornou, sem muitos esforços, o terceiro filme com maior bilheteria da história, arrecadando 1 bilhão e 303 milhões de dólares mundialmente.

Marvel Studios

Divulgação/Marvel Studios

O filme acompanha T’Challa, o rei de Wakanda, uma nação africana utópica rica em vibranium, elemento que ajudou a torná-la a mais tecnologicamente avançada do mundo. Futurista, com equipe e elenco majoritariamente negros, o longa é o exemplo mais recente de um movimento estético-artístico que utiliza de fantasia, tecnologia e referências africanas para criar narrativas ficcionais que colocam homens e mulheres negros em destaque: o Afrofuturismo.

Wakanda em quadrinhos do Pantera Negra/Marvel Comics

Wakanda nos quadrinhos do Pantera Negra/Marvel Comics

O termo foi utilizado pela primeira vez por Mark Dery, crítico e teórico cultural estadunidense, em seu ensaio Black to the future, em 1994. Ele questiona a ausência de autores afro americanos no gênero literário de ficção científica nos Estado Unidos, e ainda data o nascimento da estética dos anos 60 e 70, presentes nas notas musicais de Sun Ra, nas palavras de Octavia Butler (a primeira mulher negra a ganhar notoriedade no gênero da ficção científica) e, ainda, nos quadrinhos do Pantera negra, publicados pela primeira vez em 1966 pela Marvel Comics. Apesar do termo ter sido criado recentemente, essa estética está presente em obras do início do século 20, como em  “Princesa de Aço” de WEB Du Bois, que data de 1905, e conta a história de um sociólogo negro que inventa um “megascópio” que pode ver através do tempo e do espaço.

Mas o que isso significa?

Nós podemos entender o afrofuturismo como um movimento social, estético e cultural, que combina elementos de “ficção científica e histórica, fantasia, realismo mágico (com cosmologias não-Ocidentais) e afrocentrismo para criticar dilemas diários da população negra, como falta de autonomia, violência policial, violência contra a mulher, solidão, falta de inclusão e de oportunidades, buscando revisar, criticar e reexaminar eventos históricos do passado, como a Diáspora Africana”.

“É um movimento que abrange diversas narrativas de ficção especulativa – aquela que se propõe a especular sobre o futuro ou o passado -, sempre da perspectiva negra, tanto africana quanto diaspórica”, afirma a comunicadora Kênia Freitas, curadora da mostra Afrofuturismo: cinema e música em uma diáspora intergaláctica, que aconteceu em São Paulo, em 2015.

Sun Ra

Reprodução/Sun Ra

Um dos grandes representantes do movimento foi Sun Ra, mencionado anteriormente. Suas músicas vanguardistas uniam jazz, estéticas da mitologia egípcia e da ficção científica. Ele se dizia ser um emissário de Saturno na missão de pregar a paz.

“Eu nunca quis ser parte do planeta Terra, mas sou obrigado a estar aqui, então qualquer coisa que eu faça para este planeta é porque o Criador Mestre do universo está me fazendo fazer isso. Eu sou de outra dimensão. Eu estou neste planeta porque as pessoas precisam de mim”, explicou, em um comunicado de imprensa de 1989 da A&M Records.

A mesma ideia aparece nos trabalhos do grupo Parliament-Funkadelic, de George Clinton, que tem uma visão sobre o funk que engloba psicodelia e ficção científica, provavelmente melhor demonstrado no álbum de 1975, Mothership Connection, especialmente na música que leva o mesmo nome, que apresenta o alter ego alienígena messianico de Clinton, Star Child, que declara: “Retornamos para reivindicar as pirâmides”.

No Brasil, um dos maiores representantes talvez seja Fábrio Kabral, comO Caçador Cibernético da Rua 13”, que mistura crenças do Candomblé em um planeta altamente tecnológico. A ambientação se assemelha bastante à nação de T’Challa.

“Wakanda existe como lenda do futuro, como lembrança do passado que nunca tivemos, Wakanda existe dentro de cada pessoa preta que tem a pretensão de caminhar no mundo com os seus próprios pés e de acordo com os seus ideais. Da mesma forma que o nome Afrofuturismo, Wakanda e Pantera Negra são criações de homens brancos, mas nós nos reapropriamos do que sempre foi nosso e contamos nós mesmos a nossa história.” afirma Kabral, em sua conta na rede Medium.

Foto: Thays Berbe

Foto de Thays Berbe

Como podemos observar, o filme de Ryan Coogler, foi muito mais do que uma apresentação de um novo personagem ao universo cinematográfico dos estúdios da Marvel. Pantera Negra foi uma expressão de identidade, incitando no público o interesse em se aprofundar nessa temática.

O Comunica listou alguns artistas e obras para você conhecer mais sobre o movimento: