Filha de imigrantes poloneses e criada na cidade do Rio de Janeiro, Roseana Murray escreve poesia para diversas idades e gostos. Dentre as cerca de 100 obras publicadas,  nos chamou  a atenção um livro específico de poesias infantis, “Quem vê cara não vê coração”, no qual a escritora desconstrói e reconstrói ditados populares de uma forma lúdica e divertida. Em entrevista ao Comunica, Roseana contou um pouco mais sobre a produção do livro, sobre sua relação com a literatura e as crianças e os ditados populares.

Foto: Vanessa Koheler

A escritora Roseana Murray. Foto: Vanessa Koehler

COMUNICA: Qual a sua história com a escrita?

Roseana Murray: A minha história com a escrita começa com a leitura, eu acho que toda história com a escrita tem que começar com a leitura, a escrita é um extravasamento da leitura. Então eu comecei a ler cedo e fui uma leitora bastante voraz, gostava de escrever desde criança e durante a adolescência também. Depois de 10 anos sem escrever, retomei a escrita e logo encontrei meu caminho.

De onde surgiu seu interesse por ditados populares?

Então, a Editora Callis, em conjunto com o Instituto Callis, me perguntou se eu não queria fazer um livro, uma coletânea de poemas, com alguma particularidade ou peculiaridade da língua portuguesa a minha escolha. Então escolhi os ditados populares e eles gostaram da ideia. Eu fiz me divertindo muito, foi divertidíssimo fazer esse livro.

Mas existia algum interesse pessoal seu sobre os ditados?

Foi o que eu pensei de particularidade da língua, uma coisa que era divertida e lúdica. É interessantíssimo como se mantém, como vêm de tão longe, como às vezes o nosso ditado popular existe igualzinho em outros países, foi por aí que eu fui.

E o projeto sempre foi voltado para crianças?

Sim, era definido um livro para o público infantil.

Como você enxerga a relação entre os ditados populares e as crianças?

As crianças só vão conhecer os ditados populares se a professora falar disso, se isso entrar de alguma maneira nas aulas. Elas não sabem, quando você pergunta “me diga um ditado popular”, elas custam falar, mas depois vão lembrando e dizem que a avó fala, por exemplo, isso é muito legal.

Nos poemas eu trabalhei com duas linhas, desconstruindo o ditado ou usando ele ao pé da letra, o que fica engraçadíssimo. Como “Roupa suja se lava em casa”, eu coloquei é claro, você não vai lavar na rua, com os carros passando, fazer esse uso ao pé da letra fica muito engraçado. Foi um processo muito bacana, me diverti fazendo isso.

Os poemas foram todos escritos exclusivamente para o livro ou já existia algum pronto?

Não, eu nunca nem tinha pensado, eles foram feitos para esse livro. Fiz uma lista de ditados populares e trabalhei em cima dessa lista.

E essa foi a única vez que você escreveu sobre essas particularidades da língua?

Foi, quando me propuseram o trabalho eu nunca tinha pensado sobre, mas aí pensei e vi que isso (os ditados) é uma particularidade da língua porque é muito interessante, eles estão aqui, do mesmo jeito que existem alguns idênticos na Espanha. É algo que existe em todas as línguas e é uma sabedoria popular, quando você fala um ditado, que ao pé da letra não faz nenhum sentido, todo mundo sabe o que significa, é muito legal.

De que forma você acha que a literatura e a poesia podem ressignificar os ditados?

Olha, não sei se eles podem ressignificar, eles podem fazer pensar sobre, porque muitos ditados são muitos conservadores. E esses que são extremamente conservadores como “Filho de peixe, peixinho é,” “Diga-me com quem andas e te direi quem és” quando eu mexo com eles, eu faço pensar, e acho que é interessante, causa uma reflexão. Porque filho de peixe peixinho é? Pode ser, mas pode não ser, então é por aí também, fazer refletir. O meu livro é uma brincadeira.

E você já teve algum retorno sobre o livro com as crianças?

Eu encontro muito com crianças porque eu tenho um projeto na minha casa de receber escolas públicas. Sempre leio poemas desse livro pois a conexão é muito rápida e imediata, eles adoram e quando vou dar alguma palestra também sempre uso algum poema desse livro, gosto muito. Como “Gosto não se discute”, as pessoas amam esse poema e “Quem vê cara não vê coração” também adoram, aí eu uso.

Você acha que a associação que as crianças fazem, como o que você disse “minha avó também fala”, contribui para eles gostarem?

Sim, eles associam, e como também recebo alunos de escolas de área rural às vezes trazem alguns ditados que eu não conhecia, e é muito legal.

Você pode conhecer mais do trabalho de Roseana Murray em seu site!

 

São autores deste post Luiz Filipe Santos e Camila Mocki.

Juliana e Leila foram responsáveis por tornar este conteúdo mais acessível.